O vice-procurador-geral eleitoral, Paulo Gonet Branco, apresentou o parecer do Ministério Público Eleitoral (MP Eleitoral) sobre a Ação de Investigação que pede a inelegibilidade de Jair Messias Bolsonaro e de Walter Souza Braga Netto por abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação.
Na sessão de julgamento do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) desta quinta-feira (22),o parecer do MP Eleitoral foi pela parcial procedência da ação do Partido Democrático Trabalhista (PDT), para que seja declarada a inelegibilidade somente de Bolsonaro e para que seja absolvido o então candidato a vice-presidente, “a quem não se aponta participação no caso”. O parecer ocorreu logo após a acusação e a defesa apresentarem os respectivos argumentos.
Na ação, a legenda aponta a ocorrência de abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação na reunião realizada por Bolsonaro com embaixadores, em julho de 2022, quando o então presidente fez ataques ao sistema eleitoral brasileiro, a fim de favorecer sua candidatura à reeleição naquele ano.
Elementos evidentes
Durante a leitura do parecer, Gonet Branco apontou que o êxito da ação depende da junção de quatro elementos, que, para o MP Eleitoral, estão evidentes nos autos. “Primeiro, a condição de agente público do sujeito da conduta. Segundo, desvio de finalidade de situação vinculada ao cargo em que o sujeito está investido. Terceiro, a busca de vantagem para situação eleitoral do candidato. E quarto, a gravidade da conduta para afetar a legitimidade do processo eleitoral”, destacou.
Gonet Branco afirmou que todos os fatos descritos e apurados dizem respeito a condutas apenas do então presidente Bolsonaro e que não se atribui ao candidato a vice-presidente nenhuma participação nos eventos que motivaram a investigação. “Como não há mandato a cassar, adianto que o Ministério Público se manifesta pela improcedência da ação de investigação contra Walter Braga Netto”, afirmou.
O vice-procurador-geral eleitoral relembrou que, no evento em questão, altos representantes diplomáticos estrangeiros e autoridades brasileiras ouviram comunicações sobre a falta de confiabilidade do sistema eletrônico de votação e apuração adotado pelo TSE. “O presidente alertou que, sob esse sistema, estava-se na iminência de se realizarem eleições viciadas e ilegítimas, maliciosamente dirigidas para beneficiar o seu principal adversário. O discurso ganhou difusão nacional por meio de sistema de televisão público federal e de reprodução em redes sociais do investigado”, acrescentou. Para o MP Eleitoral, tal discurso se dirigiu ao conjunto de eleitores brasileiros, e não apenas aos representantes diplomáticos presentes.
Desconfiança
Ainda segundo o parecer, diante das circunstâncias, não há como acolher o argumento de que o então presidente da República estaria apenas exercendo direito de liberdade de expressão, movido pelo propósito de debater melhorias no sistema eleitoral. O conteúdo levado aos cidadãos pela retransmissão da reunião, segundo ele, “não contribui para o progresso das estruturas da democracia, mas a degrada ardilosamente pela destruição da confiança de que o sistema depende”.
Conforme destacou Gonet Branco, está caracterizado que o candidato à reeleição se valeu da sua situação funcional de presidente da República para, mediante notícias que sabia ou deveria saber que não são verdadeiras, obter a atenção e a adesão de eleitores. “Está caracterizado o uso da função pública para benefício eleitoral indevido”, disse.
Sobre esse ponto, ele ressaltou que a avaliação tem o abono do Supremo Tribunal Federal (STF) na Tutela Provisória Antecedente 39 (TPA). “A gravidade de ataque infundado ao sistema de votação foi realçada no voto do ministro Gilmar Mendes, quando ele disse que o discurso de ataque sistemático à confiabilidade das urnas eletrônicas não pode ser reenquadrado como tolerável em um Estado Democrático de Direito, no qual se propugna o sufrágio universal pelo voto direto e secreto como um direito fundamental qualificado como cláusula pétrea, especialmente por um pretendente a cargo político”, ressaltou.
O vice-procurador-geral eleitoral enfatizou no parecer que bastaria essa perspectiva para que a gravidade do evento fosse conhecida. Esse elemento, contudo, ganha marcada dimensão quando se levam em conta acontecimentos posteriores à reunião. “Circunstâncias que o Tribunal entendeu que compõem o âmbito de cognoscibilidade desta Aije”, citando que o juiz pode e deve levar em consideração fatos supervenientes ao ajuizamento da ação que interfiram no julgamento do mérito, conforme consta no artigo 493 do Código de Processo Civil.
Atos de 8 de janeiro
Gonet Branco ressaltou que o chamado à desconfiança das eleições não rendeu ao candidato a maioria de votos, mas provocou reações de descomedida desconfiança de parcela da população sobre a legitimidade dos resultados das urnas, como jamais se viu desde o advento da Constituição de 1988. “Igualmente sob esse segundo ângulo, exibe-se a gravidade da circunstância: o quarto elemento caracterizador do abuso poder político”, disse.
Na avaliação do MP Eleitoral, portanto, estão reunidos todos os elementos definidores do abuso de poder político de que o candidato investigado é acusado. “A conclusão do parecer se conforta em precedente do TSE de 2021, no caso Francischini, em que se definiu que ataques ao sistema eletrônico de votação podem configurar abuso de poder político e uso indevido dos meios de comunicação quando redes sociais são usadas para esse fim”, afirmou.
Para o MP Eleitoral, o precedente ressalta a outra hipótese de procedência da ação referente ao uso indevido dos meios de comunicação. “O pedido de condenação do primeiro investigado à pena que ainda resta cabível, de inelegibilidade, merece acolhida”, concluiu.