Pesquisadores da Universidade Estadual do Ceará (Uece) acabam de divulgar pesquisa científica importante para a saúde pública. O estudo aponta crescimento do número de mortes por Diabetes Mellitus (DM) associadas à desigualdade social no Brasil no período de 2010 a 2020, conforme o Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde (DataSUS). O Ceará, por outro lado, foi uma das três unidades da federação a apresentar redução. A pesquisa foi publicada na Revista Latino-Americana de Enfermagem.
No Ceará, os pesquisadores atribuem essa redução à Estratégia Saúde da Família (ESF) e ao investimento na Educação. “No Ceará, há um declínio anual de 2,2% na taxa de mortalidade por diabetes. Essa redução é diretamente relacionada à implementação da Estratégia de Saúde da Família, sugerindo que a presença dessa abordagem de cuidados primários teve impacto positivo na saúde da população cearense, notadamente no que diz respeito ao Diabetes Mellitus”, explica Thiago Garces, que é também membro do Grupo de Pesquisa Epidemiologia, Cuidado em Cronicidades e Enfermagem (Grupecce/Uece), coordenado pela professora Thereza Magalhães.
Pesquisadora orientadora, Thereza acrescenta que “o estado do Ceará investe muito em Educação, o que se mostrou uma variável determinante no sentido de prevenção desses óbitos, uma vez que os pacientes com menor escolaridade foram aqueles que mais foram à óbito. Então, leia-se que a escolaridade maior é um fator protetor para essas ocorrências”.
Com registro de mais de 600 mil óbitos relacionados ao diabetes no Brasil, as evidências da pesquisa mostram que quanto maior a desigualdade na distribuição de renda, piores são as condições de saúde no Brasil. A população mais pobre, em maior nível de vulnerabilidade social e com menor grau de escolaridade é a mais afetada pela perda de qualidade de vida, anos perdidos e óbitos causados pela doença.
Segundo a pesquisadora orientadora, professora Thereza Magalhães, o trabalho aponta que a distribuição de renda no país influencia diretamente nos números de pessoas com diabetes e de mortes pela doença, sendo, portanto, um alerta para os governos e a sociedade. “A distribuição de renda não é somente uma questão de justiça social. Ela tem também impacto direto no quadro nosológico e de morbidade do país, gerando indicadores derivados dessa desigualdade. Os resultados mostram que a desigualdade vai, indiretamente, influenciar a condição de habitação, escolaridade e o próprio acesso à saúde. Então, ter governos que se preocupem com a distribuição de renda mais equitativa também contribui para a prevenção desses óbitos”, enfatiza.
O pesquisador Thiago Garces acrescenta: “A pesquisa ressalta a urgência de incorporar esse tema nas políticas públicas de saúde. Esse direcionamento é crucial para a criação de abordagens intra e intersetoriais que não somente reduzam as disparidades sociais, mas também ampliem o acesso apropriado aos serviços de saúde relacionados à doença”.
Outro ponto que deve ter atenção, de acordo com Thereza Magalhães, é que não apenas os indicadores de saúde, de forma isolada, devem ser considerados para avaliar um determinado contexto de saúde coletiva, mas também devem ser observados os determinantes sociais da saúde. “Nós, humanos, sofremos consequências do ambiente onde vivemos e da forma como vivemos. E a escolaridade tem um papel crucial nisso, pois ela vai favorecer maior conhecimento sobre saúde e, com isso, maior autogerenciamento do diabetes”.
Thiago também enfatiza o papel da educação nesse contexto: “Merece destaque a associação entre níveis educacionais e mortalidade por diabetes. A constatação de que indivíduos com até três anos de escolaridade apresentam uma taxa de mortalidade duas vezes maior do que a população em geral salienta a importância de estratégias educacionais direcionadas para a prevenção e o gerenciamento do diabetes. Além disso, reforça a necessidade de ações inclusivas que considerem fatores socioeconômicos na formulação de políticas de saúde”.
Estados e Regiões
No Brasil, a média é de, aproximadamente, 30 mortes por diabetes a cada 100 mil habitantes. O Nordeste está à frente do quadro negativo, com 34,4/100 mil habitantes. O Sul tem média de 31,4/100 mil habitantes, seguido das regiões Sudeste, com 29,4/100 mil habitantes, Centro-Oeste, com média de 23,7/100.000 habitantes, e Norte, com 23,0/100 mil habitantes.
Em todo o país, 11 estados apresentaram aumento significativo na taxa de mortalidade por DM. Na região Norte, se destacam os estados do Amapá e Amazonas; os estados do Maranhão e Alagoas, no Nordeste; Minas Gerais, na Região Sudeste; Rio Grade do Sul, na Região Sul; e Goiás, no Centro-Oeste. Por outro lado, o Ceará, no Nordeste; o Rio de Janeiro, no Sudeste; e o Distrito Federal (DF), no Centro-Oeste, apresentaram redução da mortalidade por diabetes.
“A relação entre a Estratégia de Saúde da Família (ESF) e a taxa de mortalidade pode ser explicada pela abordagem holística da ESF nos cuidados primários de saúde. Conforme a cobertura da ESF se expande, um maior número de indivíduos passa a ter acesso a serviços preventivos, de promoção da saúde e de acompanhamento contínuo. Dessa forma, o aumento na abrangência da ESF está correlacionado a uma redução nas mortes associadas ao Diabetes Mellitus, devido à detecção mais precoce, melhor controle e gerenciamento da doença”, completa o pesquisador Thiago Garces.
São autores do artigo os pesquisadores da Uece: Thiago Santos Garces, Lara Lídia Ventura Damasceno, George Jó Bezerra Sousa, Virna Ribeiro Feitosa Cestari, Maria Lúcia Duarte Pereira e Thereza Maria Magalhães Moreira.