Se o debate sobre a inflação pode parecer restrito a economistas, seus efeitos aparecem concretos no dia a dia dos brasileiros — do café da manhã ao retorno para casa após o trabalho.
Um levantamento da CNN, com base em dados do Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) do IBGE, mostra como os aumentos afetam os gastos cotidianos.
O tradicional “pingado” que acorda o brasileiro já traz como ingrediente um dos “vilões” da inflação de abril: o leite longa vida, que subiu mais de 10% somente no mês passado.
Já o café vem desacelerando, com alta de 2,5% em abril. No entanto, em 12 meses, o aumento chega a 67,53%.
E a bebida vem acompanhada do tradicional pão francês e manteiga, que registram uma alta de 4,52% e 2,37% em abril, respectivamente.
Robson Gonçalves, economista e professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), explica que o leite sofre os efeitos da entressafra, enquanto o pão é impactado pela alta internacional do trigo, em meio ao conflito envolvendo a Rússia, um dos maiores produtores mundiais.
“No caso do leite, a embalagem também está mais cara. E ainda tem o frete para levar o produto até o supermercado. A inflação dos combustíveis não é aquela só sentida na hora de abastecer”, destaca Gonçalves.
Com o café da manhã tomado, chega a hora de ir ao trabalho. As tarifas de ônibus acumulam uma alta de 4,46% em 12 meses, mas o metrô teve um reajuste de 3,64% somente no mês passado.
No Rio de Janeiro, por exemplo, a passagem subiu de R$ 5,80 para R$ 6,50.
O economista do Ibmec Gilberto Braga aponta que a inflação é usada como indexador para vários contratos, como de transportes, atualizados anualmente. E o repasse cai no bolso do consumidor.
“Do ponto de vista empresarial e jurídico, existe uma regra que mantém esse equilíbrio, mas isso não se aplica aos salários. Existe uma livre negociação, numa relação em que o trabalhador, apesar de mais numeroso, tem um poder inferior. Até porque com o desemprego elevado, o poder de barganha diminui e cai o poder de compra”, colocou.
Após uma manhã de expediente, quem almoça em restaurantes nota uma leve subida nos preços, de 0,42% no caso das refeições. Para aquele que prefere um lanche, o reajuste é de quase 1%.
Mais 0,8% de alta no refrigerante e água mineral. E para quem não passa sem um cafezinho após o almoço, o reajuste é de 0,45% em abril, mas com um aumento de mais de 9% em 12 meses.
Enquanto a inflação da alimentação dentro de casa subiu 2,59% em abril, a de fora de casa ficou em 0,62%. Segundo a Associação Brasileira de Bares e Restaurantes (Abrasel), os empresários estão segurando os reajustes em uma tentativa de atrair os clientes perdidos durante a pandemia de Covid-19.
No fim do expediente, o transporte por aplicativo é opção para amenizar o cansaço e chegar mais rápido em casa. No entanto, esse ‘luxo’ ficou 4% mais caro em abril e acumula um crescimento de 67,18% em 12 meses, devido ao impacto no preço dos combustíveis.
Em casa, a compra no supermercado que garante o jantar em família vem encarecendo com mais intensidade, especialmente nos acompanhamentos. Por isso, o prato de feijão e arroz permanece como a principal opção à mesa.
O arroz somou um aumento de 2,22% em abril, mas uma queda de -11,53% em 12 meses. Para as regiões em que o feijão preto é mais comum, o alimento acumula uma queda de quase 7% em 12 meses.
Mas as famílias que não passam sem o feijão carioca vão ter que desembolsar 7,1% a mais, segundo o IPCA de abril, para garantir o produto.
Para quem consegue manter os acompanhamentos, a carne bovina registra um crescimento de 1,02% no mês passado, chegando a mais de 8% em 12 meses. E a inflação afeta tanto os cortes mais baratos, como o fígado, com uma alta de 19,35% em 12 meses, quanto os mais caros, como o contrafilé, com reajuste de 15,66% em 12 meses.
Apesar de mais barato que a carne vermelha, o frango subiu mais, com 17,64% no acumulado de 12 meses e 2,39% somente em abril. Outra opção para refeições mais em conta, o ovo registra um crescimento similar, de 17,70% em 12 meses e 2,19% em abril.
Mas é na tradicional salada de tomate e alface que a inflação mostra seu peso. No caso do tomate, o aumento ultrapassa 100% em 12 meses, com 10,18% em abril. Já a alface ficou 45% mais cara em 12 meses.
O que esperar da inflação para os próximos meses?
O economista Gilberto Braga, do Ibmec, projeta que a inflação chegará perto 8% neste ano, mais do que o dobro da meta definida pelo Conselho Monetário Nacional, de 3,5%.
“A inflação deve diminuir ao longo do segundo semestre, mas a diminuição não significa que vai parar de crescer ou cair. Significa que os preços vão aumentar menos”, alerta.
Já Robson Gonçalves, da FGV, avalia que a disseminação da inflação é um fenômeno mundial e que, no Brasil, o problema depende da melhora do mercado de trabalho.
“Uma pessoa de baixa renda que sai com dinheiro contado para comprar itens para o café, ou teria que comprar uma marca inferior, ou cortar o requeijão, a muçarela ou uma quantidade de pãezinhos menor. Essa inflação disseminada é no mundo inteiro e significa o empobrecimento da população, não tem como fugir”, colocou.
Fonte: CNN Brasil