Um dossiê, divulgado pela Associação Nacional de Travestis e Transexuais (Antra) na última quinta-feira (26), aponta que o Ceará foi o 2º estado do Brasil a registrar mais assassinatos de travestis e transexuais, no ano de 2022. Já o Brasil foi o país com mais mortes violentas, em todo o mundo, segundo o estudo.
O Ceará teve 11 homicídios em que vítimas foram travestis e transexuais, no ano passado, igual ao Estado de São Paulo. Os dois territórios ficaram atrás apenas de Pernambuco, com 13 mortes.
A Antra realiza o estudo desde 2017. Entre aquele ano e 2022, o Ceará registrou 84 assassinatos de travestis e transexuais, o que dá ao Estado também o 2º lugar geral – atrás apenas de São Paulo, com 116 homicídios.
‘Natasha’, de 27 anos, foi uma das travestis assassinadas no Ceará, no ano passado. Ela foi morta a tiros, no Município de Forquilha, na Região Norte do Estado, no dia 6 de outubro.
Outro episódio aconteceu no dia 27 de junho último. Uma travesti conhecida como ‘Cromada’, 32, também foi morta a tiros, no bairro Coaçu, em Fortaleza. No mesmo dia, outra travesti foi espanca na Capital, um dia antes da celebração do Dia do Orgulho LGBTQIA+.
BRASIL TEM MAIS ASSASSINATOS NO MUNDO
Em 2022, 131 pessoas trans e travestis foram assassinadas no país. Outras 20 tiraram a própria vida em virtude de discriminação e do preconceito. Os dados fazem parte do documento divulgado nesta quinta-feira (26), em cerimônia no Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. Entre os assassinatos deste ano, 130 referem-se a mulheres trans e travestis e uma a homem trans. A pessoa mais jovem assassinada tinha apenas 15 anos. Quase 90% das vítimas tinham de 15 a 40 anos.
Para o ministro dos Direitos Humanos e da Cidadania, Silvio Almeida, os dados são uma “tragédia”, mas representam a oportunidade de mudança da realidade em que vivem atualmente pessoas transexuais e travestis.
“O fato de termos um relatório como esse aponta para possibilidade de pensar superar essa tragédia. Ter o conhecimento, ter os dados, ter a possibilidade de olhar de frente para esse problema, nos traz perspectiva de mudança, de transformação”, disse. “Quando falamos sobre gênero e sexualidade, somos acusados de sermos identitários. Pergunto a essas pessoas se é possível construir um país com os números que vemos agora”, acrescentou Silvio Almeida.
De acordo com a pesquisadora responsável e secretária de Articulação Política da Antra, Bruna Benevides, contribuem para esse quadro fatores como a ausência de ações de enfrentamento da violência contra pessoas LGBTQIAP+. A falta de dados e subnotificações governamentais também podem contribuir para um cenário impreciso ao longo dos anos, além de dificultar a identificação de acusados.
“Qual é a visibilidade que pessoas trans têm tido? Se pegar o telefone e pesquisar no Google ou qualquer outro mecanismo a palavra ‘travesti’, oito em cada 10 notícias são sobre violência e esse cenário tem que mudar. Nós somos linhas de frente para sermos vistas, mas também somos linhas de frente para sermos mortas”, questionou Bruna Benevides.
Segundo o levantamento, entre os 131 assassinatos do ano passado, foram identificados 32 suspeitos. O dossiê indica que a maior parte dos suspeitos não costuma ter relação direta, social ou afetiva com a vítima. Além disso, “práticas policiais e judiciais ainda se caracterizam pela falta de rigor na investigação, identificação e prisão dos suspeitos”.
O perfil das vítimas no Brasil é o mesmo dos outros anos: mulheres trans e travestis negras e empobrecidas. A prostituição é a fonte de renda mais frequente. Entre as vítimas, 76% eram negras e 24% brancas. O levantamento mostra que mulheres trans e travestis têm até 38 vezes mais chance de serem assassinadas em relação aos homens trans e às pessoas não-binárias.
A reportagem do Diário do Nordeste questionou, na manhã desta sexta-feira (27), a Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social do Estado do Ceará (SSPDS) sobre esse cenário de violência envolvendo travestis e transexuais e aguarda posicionamento.
Fonte: Diário d Nordeste