Segundo dados da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), o etanol automotivo não atinge um patamar competitivo de preços em relação à gasolina há quase 12 anos, afastando a possível alternativa do orçamento familiar.
A regra para o cálculo é simples e muito conhecida por muitos. Se o preço do etanol representar mais de 70% do valor de revenda do litro da gasolina, abastecer com o combustível mais tradicional se torna mais vantajoso. E na série história da ANP, esse cenário não reverte desde 10 de outubro de 2010, quando o preço álcool atingiu o patamar de 69,9%.
Os dados da ANP ainda indicam que o etanol se permaneceu como opção mais vantajosa para o consumidor cearense entre os dias 20 de junho de 2010, na proporção de 69,2%, até o dia 17 de junho, quando voltou a ultrapassar os 70% do preço da gasolina, marcando 70,8%.
Desde então, a comparação evoluiu constantemente, com cenários de alta e baixa, seguindo as leis de oferta e demanda do produto no mercado cearense. O etanol ainda chegou a quase igualar o preço da gasolina em alguns momentos nos últimos anos, reduzindo ainda mais o potencial de virar solução durante os picos de encarecimento da gasolina durante a crise gerada pela pandemia de covid-19 e a guerra entre Rússia e Ucrânia.
Em outubro de 2021, a proporção entre etanol e gasolina chegou ao patamar de 91,8%. Em julho deste ano, o valor ficou ainda mais próximo da igualdade, quando o valor de revenda do álcool era 92% do da gasolina.
MAS O QUE FAZ O ETANOL NÃO SER COMPETITIVO NO CEARÁ?
Segundo Ricardo Coimbra, economista e membro do Conselho Regional de Economia no Ceará(Corecon-CE), o Ceará não tem níveis altos de produção de etanol combustível, se consolidando como um estado importador do produto. Além disso, os custos logísticos, envolvendo principalmente o transporte, também sofreram muitas pressões nos últimos anos, elevando o preço do álcool nas bombas dos postos cearenses.
Apesar de ser apontado como alternativa aos derivados do petróleo, o etanol ainda é transportado por caminhões movidos a diesel, combustível que teve altas consideráveis de preço nos últimos anos. Todos esses fatores, explicou Coimbra, atrapalham a competitividade do álcool.
“Esse cenário tá relacionado ao baixo nível de produção do etanol no Ceará, que é um grande importador, gerando um custo logístico que encarece o produto. Pernambuco tem um custo menor porque produz mais etanol, e nessas regiões, além da produção da cana-de-açúcar, você tem polos de produção de etanol, como é também ali pela zona da mata. E isso facilita o processo até o consumidor final, fazendo com o etanol seja mais competitivo em relação à gasolina nesses estados”, explicou Coimbra.
AJUSTES TRIBUTÁRIOS MENORES
As mudanças de cobrança tributária sobre os combustíveis também não favoreceram o consumo do etanol no Ceará, segundo Fábio Castelo Branco, economista e membro do Corecon-CE.
Ele explicou que, ao reduzir a alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços(ICMS) sobre os combustíveis pelo projeto de Lei Complementar 18/2022, o Governo Federal acabou reduzindo o potencial de consumo do etanol, que estava submetido a uma taxação menor. Com uma redução menor em relação à gasolina, por exemplo, o álcool combustível acabou perdendo fôlego.
“Diante da lei que limita um teto na cobrança do ICMS sobre combustíveis, a gasolina sofreu uma queda de 8,9% no preço médio no Brasil. Mas o etanol tinha uma alíquota do tributo menor que o da gasolina nos estados, inclusive aqui no Ceará, o que explica porque a redução teve mais impacto no derivado de petróleo”, disse Fábio.
“Além do menor impacto da medida legislativa, o etanol ainda sofre com os impactos da falta de chuvas que atingiu as plantações de cana-de-açúcar, matéria-prima do combustível, no fim do ano passado. A oferta de etanol está sendo menor que as expectativas e projeções da própria ANP, e isso fez com que a oferta caísse”, completou.
PERSPECTIVAS DE FUTURO
Além da análise sobre a competitividade, os economistas defenderam não haver perspectivas, de curto prazo, do etanol voltar a se tornar uma alternativa viável em relação à gasolina no Estado.
Fábio Castelo Branco afirmou que será preciso esperar a próxima quadra invernosa e a confirmação dos níveis de produção do etanol.
“A princípio não temos perspectiva do etanol voltar a ser competitivo, pelo menos a curto prazo. Deve-se aguardar como será a próxima quadra invernosa, onde as plantações de cana-de-açúcar dependem diretamente, impactando assim a oferta do combustível para mais ou para menos”, disse.
Já Ricardo Coimbra defendeu que se não houver ações de incentivo tributário ou um foco no esforço para atração de novas usinas de etanol para o Ceará, é muito provável que o combustível siga sendo preterido em relação à gasolina nos próximos anos.
“Tivemos uma redução de ICMS do etanol, mas poderíamos ter uma política de redução sistemática do imposto para criar algum tipo de redução do custo logístico da cadeia do etanol para gerar mais competitividade no Ceará. E também poderíamos tentar atrair usinas de produção do álcool para o Estado. Temos uma produção aqui, mas é para geração de álcool etílico, o que é diferente”, disse.