Ao apresentar aos vereadores, ainda em fevereiro, um projeto de lei que teria como objetivo principal regularizar a entrada do Município de Juazeiro do Norte no consórcio Projeto de Estruturação e Manejo de Resíduos Sólidos (Comares – UC), a gestão de Glêdson Bezerra (Podemos) recebeu de volta o texto aprovado, mas com uma emenda que, em resumo, exclui a previsão de cobrança de taxa na coleta, o que desencadeou uma série de impasses para a adequação da Prefeitura à proposta dos consórcios.
A gestão do lixo, que envolve questões urgentes de infraestrutura e saúde pública, avança nas principais cidades do Estado e requer ações assertivas dos governantes para se adaptarem às normais impostas no País.
Participar do consórcio organizado pelo Governo do Estado significa uma espécie de “união de forças” entre municípios cearenses que, juntos, desenvolvem soluções para coleta e manejo do lixo em aterros, acabando com os lixões a céu aberto.
ENTENDA O CASO
A mudança ao projeto da Prefeitura, eliminando a previsão de cobrança de uma taxa do lixo, proposta pela vereadora Auricélia Bezerra (PTB), no entanto, está em desacordo com o Marco Regulatório do Saneamento aprovado pelo Congresso Nacional em 2020. A alteração trouxe consequências que isolaram Juazeiro do Norte dos municípios vizinhos.
A Prefeitura, através da Autarquia Municipal de Meio Ambiente (Amaju), destaca que o projeto enviado aos parlamentares “não era para criar taxa do lixo, apenas para autorizar uma futura taxação, como estabelece a normal nacional”. No entanto, faltou articulação entre Executivo e Legislativo.
A movimentação no Parlamento, portanto, excluiu a participação do município no consórcio Comares, um projeto pioneiro de iniciativa do Governo do Estado através da Secretaria das Cidades.
Em resumo, a tramitação do projeto de lei que, em outros municípios do grupo, se deu apenas como ação protocolar no Legislativo Municipal, acabou se tornando, após a emenda aprovada pelos vereadores, o motivo da exclusão do município do projeto pelo impasse na legislação.
Fazem parte desse grupo específico, além de Juazeiro do Norte, os municípios da Região Metropolitana do Cariri: Crato, Barbalha, Caririaçu, Farias Brito, Jardim, Missão Velha, Nova Olinda, Santana do Cariri e Altaneira.
ALTA PRODUÇÃO DE LIXO
“Esse debate (sobre taxação) seria feito em um outro momento, com outro projeto, a Câmara deveria ter se pronunciado pela inconstitucionalidade da lei aprovada, e não houve isso. Vereadores têm a legitimidade de fazer a votação e suas observações, mas isso foi feito em cima de uma questão já regulamentada”, lamenta o superintendente da Amaju, Eraldo Oliveira.
Ele destaca ainda que Juazeiro seria a principal cidade no projeto, uma vez que o lixo produzido corresponde cerca de 50% da soma de todos os municípios no consórcio.
Isso é um atraso. A gente se frustra um pouco porque a estruturação está sendo feita, mas nós não podemos esperar, na linha temporal, que se resolva o entendimento de ordem política.
ERALDO OLIVEIRA
Superintendente da Amaju
Em contrapartida, o então presidente da Câmara Municipal, vereador William Bazílio(PMN), responsável pela condução da sessão em fevereiro, minimiza o desfecho da aprovação da emenda.
“Eu apenas coloquei em votação e os vereadores aprovaram o texto”, justifica o parlamentar, que atualmente não exerce mais o cargo de presidente, após o retorno de Darlan Lobo (MDB) no último dia 17.
A reportagem entrou em contato com Auricélia Bezerra (PTB), autora da modificação que inviabilizou a Lei. Como a resposta, a parlamentar disse que precisaria “pegar o projeto para resfrescar a memória”, e que não poderia comentar o assunto.
INICIATIVA PRIVADA
Uma vez excluído do grupo para compartilhamento de soluções e investimentos que poderão acabar com o problema dos lixões a céu aberto, a Prefeitura de Juazeiro busca a iniciativa privada para viabilizar a construção de um aterro sanitário.
“Estamos fazendo uma discussão com alguns investidores. Esse projeto vamos apresentar na próxima semana”, diz ainda o superintendente.
De acordo com a Amaju, a intenção é fazer um projeto no qual cooperativas de coletores de recicláveis sejam organizadas, dando seguimento à organização das pessoas que já trabalham no lixão.
Em julho do no passado, uma ação da Prefeitura, de acordo com Glêdson Bezerra, transformou o lixão em um “aterro controlado”. Ainda segundo a gestão, ações para “humanizar” o local foram feitas, como, por exemplo, o soterramento dos resíduos para evitar a produção de fumaça, iluminação e banheiros para catadores que trabalham no local.
A expectativa é de que a Prefeitura de Juazeiro do Norte, através da Procuradoria, acione o Ministério Público Federal (MPCE), no intuito de reaver soluções para adesão do município ao Comares.
ATUAÇÃO DO MPCE EM JUAZEIRO
Em três anos (2019, 2020 e 2021), o MPCE instaurou 119 procedimentos extrajudiciais civis e 149 procedimentos criminais no que diz respeito à gestão de resíduos sólidos no Ceará. O tema é acompanhado pelo Centro de Apoio Operacional do Meio Ambiente (Caomace).
O problema da gestão de resíduos sólidos em Juazeiro é antigo. Em março de 2019, por meio das Promotorias de Justiça do Meio Ambiente e do Patrimônio Público em Juazeiro do Norte, o MPCE ajuizou uma Ação Civil Pública (ACP) requerendo a construção de um aterro sanitário e o fechamento do lixão municipal em até um ano.
Segundo as Promotorias de Justiça, “os cidadãos que vivem próximo ao lixão reclamam constantemente dos danos à saúde causados pelo lixão”.
Além disso, a Infraero encaminhou ofícios ao Ministério Público e à Prefeitura informando que o funcionamento irregular do lixão compromete a segurança operacional da aviação, podendo ocasionar acidentes aéreos e colocando vidas humanas em risco.
INICIATIVAS NO CEARÁ
No Ceará, onde estão ativos mais de 300 lixões a céu aberto, a gestão correta dos resíduos sólidos é desafio para todos os 184 municípios.
O Brasil tem a meta de extinguir todos os lixões ativos no País até 2024, daqui a dois anos. Isso foi definido no Novo Marco do Saneamento Básico, sancionado em 2020.
Contudo, segundo último levantamento da Associação Brasileira de Empresas de Limpeza Pública e Resíduos Especiais (Abrelpe), 40% do lixo que produzimos ainda são descartados irregularmente nesses locais, provocando prejuízos ambientais e aos cofres públicos.
Fonte: Diário do Nordeste
Foto: Antonio Rodrigues