O ministro da Educação, Milton Ribeiro, afirmou em reunião com prefeitos que repassa verbas para municípios indicados por dois pastores, a pedido do presidente Jair Bolsonaro.
O áudio da reunião foi obtido pelo jornal “Folha de S.Paulo”, que revelou o conteúdo da fala de Ribeiro em reportagem na edição desta terça-feira (22).
Os pastores a que o ministro se refere no áudio são Gilmar Santos e Arilton Moura. Eles não têm cargo no governo, mas participaram de várias reuniões com autoridades nos últimos anos.
Gilmar Santos é presidente da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros das Assembleias de Deus no Brasil Cristo Para Todos (Conimadb). Arilton Moura também é da Assembleia de Deus.
“Foi um pedido especial que o presidente da República fez para mim sobre a questão do [pastor] Gilmar”, disse o ministro, segundo o áudio revelado pelo jornal. Além dos prefeitos, estavam na reunião também os dois pastores.
“Porque a minha prioridade é atender primeiro os municípios que mais precisam e, segundo, atender a todos os que são amigos do pastor Gilmar”, complementou Ribeiro.
Em determinado ponto da reunião, o ministro diz ainda que há uma contrapartida para esses repasses, mas não dá detalhes sobre isso.
“Então, o apoio que a gente pede não é segredo. Isso pode ser [inaudível] é apoio sobre construção das igrejas”, disse.
Procurado, o Ministério da Educação não informou as circunstâncias em que o áudio foi gravado, como data e local, mas que deve divulgar uma nota sobre o assunto ainda nesta terça-feira.
Encontros com autoridades
Os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura são personagens com trânsito em gabinetes de altas autoridades em Brasília.
Em 2019, primeiro ano do mandato, estiveram com o presidente Jair Bolsonaro no Palácio do Planalto. Primeiro, em abril, Gilmar Santos foi fotografado ao lado do presidente em uma solenidade .
Em outubro daquele ano, também no palácio, os dois participaram de um evento em que o presidente estava presente e, de acordo com registros oficiais do governo, entregaram a Bolsonaro um livro produzido pela Conimadb.
E também em 2021 os dois se reuniram 18 vezes com Milton Ribeiro, de acordo com registros oficiais.
A agenda do ministro afirma que esses encontros eram de “cortesia” ou para tratar de “obras” ou de “alinhamento político”.
Em um desses encontros, em agosto, o presidente do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), Marcelo Lopes, esteve presente. De acordo com a reportagem de “Folha de S.Paulo”, os recursos que Ribeiro dirige aos municípios indicados pelos pastores são do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE).
‘Gabinete paralelo’ de pastores
Na semana passada, o jornal “O Estado de S. Paulo” publicou reportagem na qual informava que o Ministério da Educação tem um “gabinete paralelo” de pastores que controlam a agenda e a verba do ministério.
O jornal afirmou ainda que Gilmar Santos e Arilton Moura têm trânsito livre no ministério e atuam como lobistas.
Segundo o jornal, desde o início do ano passado, o Ministério da Educação empenhou ou executou pagamentos de R$ 9,7 milhões nos dias seguintes aos encontros dos pastores com o ministro.
Oposição reage
Nesta terça-feira, a oposição apresentou ao Supremo Tribunal Federal (STF) notícia-crime contra o presidente Jair Bolsonaro e Milton Ribeiro por suposto favorecimento indevido a pastores.
No documento, o líder da Minoria, deputado Alencar Santana Braga (PT-SP), pede que, se confirmadas irregularidades, Milton Ribeiro seja afastado do cargo.
O pedido solicita ainda um parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre o tema.
“O Ministério da Educação não pode ser utilizado como instrumento de propaganda ideológica do governo federal, muito menos como um local para troca de favores e agrados a aliados do presidente da República”, afirma o pedido da oposição.
O senador Fabiano Contarato (PT-ES) também informou ter apresentado ao STF uma notícia-crime na qual pediu a investigação de Milton Ribeiro e a abertura de um inquérito pela PGR.
O PSOL informou que vai enviar uma representação para o Ministério Público para pedir que o ministro e Bolsonaro sejam investigados, além dos dois pastores.
“A atuação do ministro Ribeiro, seguindo as diretrizes de Bolsonaro e seus apoiadores mais influentes, longe do que preconiza a boa atuação do servidor público, atende a interesses particulares e pessoais, e não ao interesse público”, afirmou o PSOL na representação.
O partido diz ainda que podem ter sido cometidos os crimes de tráfico de influência, prevaricação e advocacia administrativa.