O ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes retirou o sigilo da decisão que autorizou busca e apreensão de empresários bolsonaristas.
Nos pedidos de busca e apreensão de celulares e de quebra de sigilo de mensagens dos empresários, a Polícia Federal afirmou ao Supremo que as investigações apontam riscos para as instituições democráticas diante da mobilização do grupo.
Os alvos foram: Afrânio Barreira Filho, do restaurante Coco Bambu; Ivan Wrobel, da W3 Engenharia; José Isaac Peres, do grupo Multiplan; José Koury, dono do Shopping Barra World; Luciano Hang, da Rede Havan; Luiz André Tissot, da Indústria Sierra; Marco Aurélio Raymundo, da Rede Mormaii; e Meyer Joseph Nigri, da Tecnisa.
A Polícia Federal afirma que “um grupo de empresários, a pretexto de apoiar a reeleição para presidente de Jair Messias Bolsonaro, demonstra aderência voluntária ao mesmo modo de agir da associação especializada ora investigada no bojo do inquérito das milícias digitais, suspeitas de atuarem contra os poderes da República e a democracia”.
Os investigadores afirmam que o objetivo é “atacar integrantes de instituições públicas, desacreditar o processo eleitoral brasileiro, reforçar o discurso de polarização, gerar animosidade dentro da própria sociedade brasileira, promovendo o descrédito dos poderes da República, além de outros crimes”.
No pedido, a polícia cita e reproduz a reportagem do site Metrópoles que publicou mensagens trocadas entre os empresários em que eles estariam defendendo “de forma ostensiva a prática de atos para abolir o Estado de Direito, caso o candidato à Presidência da República, Luiz Inácio Lula da Silva, seja eleito no próximo pleito eleitoral ao cargo de presidente da República”.
Uma das mensagens é do empresário José Koury: “Prefiro golpe do que a volta do PT. Um milhão de vezes. E com certeza ninguém vai deixar de fazer negócios com o Brasil. Como fazem com várias ditaduras pelo mundo”.
Ao atender os pedidos da Polícia Federal, o ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes citou uma potencial conexão da atuação dos empresários com o modelo de financiamento de atos contra a democracia já investigados.
“As condutas noticiadas nestes autos e identificadas pela Polícia Federal estão abarcadas pelo objeto do referido inquérito, notadamente pela grande capacidade socioeconômica do grupo investigado, a revelar o potencial de financiamento de atividades digitais ilícitas e incitação à prática de atos antidemocráticos.”
Ao autorizar a busca e apreensão, Alexandre de Moraes listou leis e uma série de entendimentos do STF que permitem restringir direitos individuais para viabilizar investigações.
Moraes afirmou que o caso se enquadra no “artigo 240 do Código de Processo Penal, que fixa os critérios para a ordem judicial de busca e apreensão no domicílio pessoal, pois devidamente motivada em fundadas razões que, alicerçadas em indícios de autoria e materialidade criminosas, sinalizam a necessidade da medida para colher elementos de prova relacionados à prática de infrações penais”.
Ao autorizar a quebra do sigilo bancário e telemático, o ministro voltou a afirmar que direitos e garantias individuais não são absolutos e ilimitados, e que “não podem ser utilizados como escudo protetivo da prática de atividades ilícitas, tampouco como argumento para afastamento ou diminuição da responsabilidade civil ou penal por atos criminosos, sob pena de desrespeito a um verdadeiro Estado de Direito”.
Investigadores apontam que há indícios de que as mensagens trocadas fazem parte de um contexto mais amplo de atuação ilegal. Isso porque parte dos empresários é alvo de outros inquéritos no STF que apuram a organização e financiamento de divulgação de fake news e ataques à democracia.
Os empresários são investigados por crimes como organização criminosa e crimes contra o Estado Democrático de Direito. Agora a investigação entrou em uma nova fase. Os peritos analisam todo o material apreendido e as mensagens. Também vão fazer o cruzamento de dados para apurar o financiamento desses atos antidemocráticos.
O que dizem os citados
Afrânio Barreira Filho disse que não há qualquer indicativo do alegado envolvimento dele em atos que busquem a ruptura do Estado Democrático de Direito ou que visem a desacreditar o processo eleitoral brasileiro. Disse que não atentou, pensou, verbalizou, defendeu, financiou ou conspirou contra a democracia, e que jamais o fará; que seja quem for eleito presidente, ele continuará focado na empresa, no trabalho, no crescimento, na geração de empregos. Disse ainda que não tem envolvimento com movimento antidemocrático nem abordou assuntos antidemocráticos com quem quer que seja, e que reitera a oposição a qualquer ato que busque interferir no exercício dos poderes ou viole as leis e a Constituição.
A defesa de Ivan Wrobel afirmou que o cliente não faz parte de qualquer organização que pretenda obstruir ou financiar qualquer princípio democrático ou a ruptura do Estado Democrático de Direito; que o empresário vem colaborando e não se esquivou de responder às perguntas durante o depoimento; e que os documentos mostram que o empresário jamais participou de qualquer conspiração contra o Estado brasileiro.
José Koury afirmou que os trechos das conversas foram usados fora do contexto; que o grupo tem mais de 200 participantes de diversas ideologias políticas, que comentam vários assuntos; que a maioria nem se conhece; que pensar em conspiração lhe parece uma teoria muito fantasiosa; e que sempre foi defensor da democracia e da livre liberdade de expressão e de pensamento.
Luciano Hang afirmou que ele e os advogados tomaram conhecimento da decisão pela imprensa, que ela não traz nada de novo e que sequer indica quais seriam as mensagens dele que representam ato antidemocrático. Hang reafirmou que não defendeu ou arquitetou nenhum golpe e que é um defensor da liberdade e da democracia.
A defesa de Meyer Nigri afirmou que muitas pessoas do grupo sequer se conheciam pessoalmente e que nunca se reuniram, que é inaceitável a inferência de que houve adesão voluntária dos integrantes para atacar instituições democráticas e que o empresário concordou em ser ouvido no dia da operação, reafirmando sua convicção democrática e seu respeito às instituições republicanas.
A defesa do empresário Marco Aurélio Raymundo afirmou que constam da decisão conversas pinçadas de grupo privado de WhatsApp, que serviram de fundamento aos comandos coercitivos do Judiciário e que o empresário reitera a fé na democracia e na liberdade de expressão.
Luiz André Tissot e José Isaac Peres não quiseram se manifestar.
Fonte: G1