A Comissão de Esporte (CEsp) aprovou nesta quarta-feira (8) projeto de lei que regulamenta as apostas esportivas de quota fixa, conhecidas como bets. O texto, do Poder Executivo, recebeu relatório favorável pelo presidente do colegiado, senador Romário (PL-RJ). O PL 3.626/2023 tramita simultaneamente na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), que ainda não pautou a votação da proposição. Em seguida, o texto segue para o Plenário.
O texto altera a lei que trata da distribuição gratuita de prêmios a título de propaganda e a que trata da destinação da arrecadação de loterias e da modalidade lotérica de apostas de quota fixa. De acordo com a proposta, a aposta de quota fixa inclui eventos virtuais de jogos on-line e eventos reais de temática esportiva, como jogos de futebol e vôlei. Nessa modalidade, o apostador ganha caso acerte alguma condição do jogo ou o resultado final da partida.
Segundo a proposição, as apostas podem ser realizadas em meio físico, mediante aquisição de bilhetes impressos, ou virtual, por meio de acesso a canais eletrônicos. O ato de autorização deve especificar se o agente operador pode atuar em apenas uma ou em ambas as modalidades.
O projeto trata ainda do fantasy sport — modalidade eletrônica em que ocorrem disputas em ambiente virtual a partir do desempenho de pessoas reais. De acordo com o texto, esse tipo de aposta não se configura como exploração de modalidade lotérica e fica dispensado de autorização do poder público.
Autorização
O projeto exige apenas uma autorização do Ministério da Fazenda para a empresa que explora o sistema de aposta de quota fixa. A autorização vale por cinco anos e pode ser revista a qualquer tempo, assegurados o contraditório e a ampla defesa do interessado. Somente podem ser autorizadas pessoas jurídicas que cumpram alguns requisitos, como:
- Ser constituída segundo a legislação brasileira, com sede e administração no território nacional, e atender às regulamentação do Ministério da Fazenda;
- Ter pelo menos um dos integrantes do grupo de controle com comprovado conhecimento e experiência em jogos, apostas ou loterias;
- Possuir requisitos técnicos e de segurança cibernética a serem observados em seus sistemas e tecnologia de informação;
- Adotar procedimentos de controle interno, como o atendimento aos apostadores e ouvidoria; e
- Possuir política de prevenção à lavagem de dinheiro, ao financiamento do terrorismo, à proliferação de armas de destruição em massa, aos transtornos de jogo patológico e à manipulação de resultados e outras fraudes.
O procedimento administrativo de autorização deve tramitar em meio eletrônico. Durante a análise, o acesso ao processo fica restrito ao interessado e ao represente. A autorização só é expedida se, após o exame da documentação, o Ministério da Fazenda concluir pela capacidade técnica e financeira da empresa e pela reputação e conhecimento de controladores e administradores. As empresas devem pagar uma contraprestação limitada a R$ 30 milhões.
Publicidade
Os canais eletrônicos e os estabelecimentos físicos utilizados pelo agente operador devem exibir, em local de fácil visualização, dados como:
- número e data de publicação da portaria de autorização;
- endereço físico da sede; e
- contato do serviço de atendimento ao consumidor e ouvidoria.
As ações de comunicação e publicidade da loteria de apostas, veiculadas pelos agentes operadores, devem divulgar avisos de desestímulo ao jogo e advertência sobre seus malefícios, além de observarem a restrição de horários e canais de veiculação. Fica vedada publicidade que apresente a aposta como socialmente atraente ou que contenha afirmações de personalidades conhecidas que sugiram que o jogo contribui para o êxito social ou pessoal.
Também é proibida a divulgação de afirmações infundadas sobre as probabilidades de ganhar ou que sugiram que a aposta pode constituir alternativa de emprego, solução para problemas financeiros ou forma de investimento financeiro. O texto também veda ao agente operador adquirir direitos de eventos desportivos para qualquer forma de exibição de sons e imagens.
Prescrição das apostas
O apostador perde o direito de receber o prêmio ou de solicitar reembolso se o pagamento devido não for creditado na conta gráfica mantida pelo agente operador. Além disso, prescreve o prêmio não reclamado pelo apostador em 90 dias, contados da data da divulgação do resultado do evento objeto da aposta.
Metade do valor dos prêmios não reclamados vai para o Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). A outra metade, para o Fundo Nacional para Calamidades Públicas, Proteção e Defesa Civil (Funcap), observada a programação financeira e orçamentária do Poder Executivo.
Integridade
O PL 3.636/2023 prevê ações de mitigação de manipulação de resultados e de corrupção nos eventos esportivos objeto de apostas de quota fixa transmitidos ao vivo. São consideradas nulas as apostas comprovadamente realizadas mediante fraude.
Os recursos dos apostadores não podem ser dados em garantia de débitos assumidos pela empresa operadora das apostas. Além disso, o agente operador deve adotar procedimentos de identificação que permitam verificar a validade da identidade dos apostadores.
O texto traz ainda um rol de impedidos para realizar apostas:
- menor de idade;
- pessoa com influência significativa ou funcionário da empresa operadora das apostas;
- agente público com atribuições diretamente relacionadas à regulação e à fiscalização da atividade;
- pessoa que tenha ou possa ter acesso aos sistemas informatizados de loteria da aposta; e
- qualquer pessoa que tenha ou possa ter influência no resultado do evento objeto de loteria, como atletas e demais participantes.
Penalidades
Eventuais infrações devem ser apuradas mediante processo administrativo, com penas aos agentes operadores. Elas vão de advertência a multas limitadas a 20% sobre o produto da arrecadação. Segundo o texto, a multa não pode ser inferior à vantagem obtida pelo infrator e nem superior a R$ 2 bilhões por infração. Entre as penas impostas, pode ocorrer:
- suspensão parcial ou total do exercício das atividades por até 180 dias;
- cassação da autorização;
- proibição de obter nova autorização por até dez anos;
- proibição de participar de licitação por prazo não inferior a cinco anos; e
- inabilitação para atuar como dirigente de empresa que explore qualquer modalidade lotérica por até 20 anos.
No caso das demais pessoas físicas ou jurídicas, quando não for possível utilizar o critério do produto da arrecadação em caso de multas, elas podem variar de R$ 50 mil reais a R$ 2 bilhões. O Ministério da Fazenda pode deixar de instaurar ou suspender processo administrativo para apurar a infração, se o investigado cessar a prática sob investigação e corrigir as irregularidades apontadas.
Distribuição da arrecadação
O texto aprovado em setembro na Câmara dos Deputados destinava 2% do valor arrecadado para a seguridade social. Outros destinatários dos recursos seriam as áreas de esporte (6,63%) e turismo (5%).
No esporte, os valores seriam divididos entre o Ministério do Esporte (4%), atletas (1,13%) e confederações esportivas específicas, com percentuais que variavam de 0,05% a 0,4%. Meio por cento do valor seria direcionado a secretarias estaduais de esporte, que teriam de distribuir metade às pastas municipais de esporte, proporcionalmente à população da cidade.
No turismo, 4% seriam destinados ao Ministério do Turismo e 1% à Agência Brasileira de Promoção Internacional do Turismo (Embratur). A Lei 13.756, de 2018, que criou essa modalidade de loteria, previa que as empresas ficariam com 95% do faturamento bruto (após prêmios e imposto de renda), enquanto o projeto limita o valor a 82%.
Segundo a proposta, a área de educação ficaria com 1,82% do que for arrecadado. Dentro desse montante, 0,82% iriram para escolas de educação infantil ou de ensinos fundamental e médio que tiverem alcançado metas para resultados de avaliações nacionais. O restante (1%) ficaria com as escolas técnicas públicas de nível médio.
No substitutivo apresentado à CEsp, o relator, senador Romário, optou por elevar de 6,63% para 6,68% os repasses à área do esporte. O acréscimo de 0,05% vai para o Comitê Brasileiro do Esporte Master. O turismo tem uma redução de 5% para 4,5%.
Além disso, o senador direciona 0,5% do valor arrecadado ao Ministério da Saúde para o desenvolvimento de medidas de prevenção, controle e mitigação dos danos sociais advindos da prática de jogos. Outros 0,15% devem ser divididos igualmente entre as seguintes entidades: Federação Nacional das Associações de Pais e Amigos dos Excepcionais (Fenapaes), Federação Nacional das Associações Pestalozzi (Fenapestalozzi) e Cruz Vermelha Brasileira.
Emendas ao texto
O relator acolheu total ou parcialmente 15 emendas apresentadas ao texto. Os senadores Nelsinho Trad (PSD-MS) e Soraya Thronicke (Podemos-MS) sugeriram que o prazo de autorização do Ministério da Fazenda ao agente operador de apostas fosse ampliado de três para cinco anos. O senador Jorge Kajuru (PSB-GO) propôs que ações de publicidade e propaganda sejam destinadas apenas ao público adulto.
Romário apresentou duas mudanças ao texto. Uma delas permite que o agente operador possa explorar até três marcas comerciais em canais eletrônicos por ato de autorização. O limite original era de apenas uma marca comercial.
Durante a discussão da matéria nesta quarta-feira, a CEsp aprovou outras duas emendas destacadas pelos parlamentares. O senador Izalci Lucas (PSDB-DF) sugere que as lotéricas também fiquem autorizadas a vender apostas por quota fixa. O senador Eduardo Girão (Novo-CE) propõe que seja proibida a veiculação de qualquer peça publicitária sobre as apostas entre 6h e 22h59.
Agência Senado