A resistência em se tomar vacinas é um problema de saúde global que prejudica o enfrentamento de doenças e aumenta o número de mortes preveníveis.
Segundo epidemiologistas, fatores diversos explicam a recusa por parte da população em receber os imunizantes. O medo, a falta de informação, a desinformação (fake news) e o próprio movimento antivacina contribuem para afastar as pessoas das campanhas de imunização.
Uma notícia falsa recente, que tem circulado na internet, associa a imunização contra a Covid-19 ao desenvolvimento da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida, nome técnico da Aids.
Em sua live semanal, realizada no dia 21 de outubro, o presidente Jair Bolsonaro reproduziu trechos da notícia falsa. No entanto, o presidente não utilizou o termo Aids durante a live.
“Relatórios oficiais do governo do Reino Unido sugerem que os totalmente vacinados – quem são os totalmente vacinados? Aqueles que depois da segunda dose, né, 15 dias depois, 15 dias após a segunda dose, totalmente vacinados – estão desenvolvendo a síndrome de imunodeficiência adquirida muito mais rápido do que o previsto, recomendo ler a matéria”, diz Bolsonaro.
Por conta da afirmação falsa, Facebook e Instagram tiraram o vídeo da live do ar.
Especialistas consultados pela CNN reforçam que a afirmação é falsa e que não existem evidências científicas na relação entre vacinas e a Aids. Procurado, o Ministério da Saúde não respondeu até o fechamento da reportagem.
O que diz a ciência sobre a Aids
A Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (Aids) é uma doença causada pela infecção pelo HIV (vírus da imunodeficiência humana). O vírus ataca o sistema imunológico, responsável pela defesa do organismo. No entanto, nem todas as pessoas infectadas com o HIV desenvolvem a Aids. O tratamento antirretroviral reduz a carga viral no organismo, impedindo o desenvolvimento da doença.
As vacinas estimulam o sistema imune a produzir anticorpos específicos contra as doenças, além de induzir a ativação de outras células de defesa do organismo, os linfócitos T.
“As vacinas não provocam imunodeficiência. O que elas fazem é colocar o seu sistema imune em confronto com um agente estranho, montando a resposta do organismo à presença dele”, explica a pesquisadora Tânia Vergara, da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI).
Em relação ao HIV, a pesquisadora Sylvia Lopes Maia Teixeira, do Laboratório de AIDS e Imunologia Molecular do Instituto Oswaldo Cruz (IOC/Fiocruz), explica que não há uma associação entre o vírus e as vacinas.
“Não há nenhum fundamento científico em se falar que a vacina da Covid-19 ou qualquer outra vá desenvolver HIV. A vacina não tem nada na sua composição que possa explicar o fato de ela transmitir HIV”, afirma Sylvia.
Em nota enviada à CNN, o Conselho Federal de Medicina (CFM) afirmou que apoia a realização de ampla campanha de vacinação contra a Covid-19, que tem se mostrado eficaz para conter o avanço da epidemia e o agravamento do quadro clínico de infectados.
“O CFM desconhece a existência de estudos científicos válidos que associem a imunização ao surgimento da síndrome de imunodeficiência humana adquirida. Neste sentido, para proteger sua saúde, a população deve levar em consideração as recomendações das autoridade/s sanitárias sobre o tema”, diz o texto.
No dia 23 de outubro, a Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI) divulgou uma nota de esclarecimento sobre o assunto afirmando que não se conhece nenhuma relação entre qualquer vacina contra a Covid-19 e o desenvolvimento de síndrome da imunodeficiência adquirida.
O texto recomenda, ainda, que pessoas que vivem com HIV/Aids se vacinem contra a Covid-19, incluindo a dose de reforço (terceira dose) para todos que receberam a segunda dose há mais de 28 dias.
Segundo a pesquisadora da Fiocruz, as pessoas vivendo com HIV em tratamento podem apresentar níveis de imunidade normais, semelhantes aos de pessoas que não vivem com o vírus. No caso de indivíduos que apresentam grau mais elevado de imunossupressão, a vacinação é ainda mais importante.
“Em pessoas que estão em uma fase da infecção em que a carga viral, que é a quantidade de vírus circulando no organismo, pode estar mais elevada, isso pode trazer alguma imunossupressão. Elas podem estar com o sistema imunológico um pouco mais enfraquecido, por isso a importância de essas pessoas se vacinarem”, ressalta Sylvia.