Com olhar apurado, Ana Beatriz Ribeiro, de 28 anos, enxerga roupa nas formas da natureza e nas tradições do Cariri cearense. Ela transforma o jatobá, a Chapada do Araripe e a obra de Patativa do Assaré em vestidos, calças, croppeds, saias, kimonos e o que mais a criatividade permitir.
Da paixão pelas raízes nasceu a Açude, marca idealizada por Ana Beatriz ainda na universidade e lançada oficialmente em novembro de 2020. “Açude pra gente é uma forma de manter a vida no Nordeste, simboliza permanência, resistência de tudo o que é nosso, daquilo que nasce aqui. Construir Açude é fortalecer quem a gente é”, como a marca é definida.
A paixão pela moda surgiu ainda na infância, quando acompanhava a mãe nas idas às lojas de tecidos e costureiras para produzir roupas próprias. “Minha mãe sempre gostou de roupa e ‘adotou’ a mesma costureira até hoje pra confeccionar as peças e eu adorava aquilo”.
Vendedora de bonecas de pano e costureira em Juazeiro do Norte, a avó Zeferina, hoje com 98 anos, também foi forte influência para essa construção. “A marca ia chamar Zeferina, em homenagem a ela, mas não deu certo por questões de patente do nome e aí, depois de um brainstorming, veio a Açude”.
À medida que foi crescendo, o vínculo com a moda também foi aumentando e, aos 15 anos, ela conta ter começado a acompanhar estilistas, como Alexandre Herchcovitch, ler revistas, criar as próprias roupas. Ainda na adolescência chegou a fazer cursos de costura e bordado.
“Mas como tava nesse universo de criação, de cores, de formação, no meio da faculdade, comecei a fazer moda, mas tive que parar pra começar a estagiar na arquitetura. Depois, fui fazer intercâmbio na Bélgica e lá eu, de fato, decidi que não era aquilo que eu queria”.ANA BEATRIZ RIBEIROdesigner de moda
Um ano depois, Ana Beatriz voltou ao Brasil e se formou. Logo depois, iniciou a faculdade de moda na Universidade de Fortaleza. “Eu queria montar uma marca, já tinha isso na cabeça. Aproveitei a pesquisa que fiz pro meu trabalho de conclusão de curso da arquitetura, em que criei um projeto de espaço de ensino de design e artesanato”.
Debruçada na história da terra natal, nas pessoas e na potência cultural, o projeto, para ela, foi o despertar para o que fazia sentido, a conexão com as raízes, então, no decorrer da segunda graduação, a Açude foi surgindo.
Inspirada nas rezadeiras locais nasceu Bença e uma das peças é a cropped Olhado, com um recorte no busto com o formato de um olho. O vestido Benedito traz curvas em recortes que remetem à energia envolvida no universo da reza, oração e fé.
Na segunda quinzena deste mês, a designer lança Babaçu. A nova coleção é baseada na planta da família das palmeiras, nativa da região caririense. Uma das peças é o top Cacho, que imita a textura de bolinhas da planta.
“A ideia não é se limitar só a natureza, mas pensar na cultura nordestina de uma forma bem diferente. Acho que a minha formação em Arquitetura me ajuda muito a ver essas formas pra fazer peças diferentes, a modelagem é algo que chama atenção nas minhas peças. Vejo um cacto, por exemplo, com um formato diferente e enxergo um decote”.
Hoje, as peças estão disponíveis para venda em Fortaleza, em São Paulo e ainda online.
MODA E SUSTENTABILIDADE
Confluindo com o propósito da marca, a cearense optou por trazer a sustentabilidade para a Açude usando tecidos mais naturais, como o linho e evitando os que contêm plástico na composição a exemplo do poliéster. “Tenho muito essa preocupação com o produto que a gente coloca no mundo, sempre opto também por trabalhar com fornecedores locais e fazer o dinheiro circular por aqui”.
Além disso, Ana Beatriz trabalha com upcycling, reaproveitando resíduos que seriam descartados para produzir novas peças. O cropped Broto, por exemplo, foi feito com tecidos que seriam jogados no lixo, assim como o top Sol que tem recortes feitos com linho e brim.
Fonte: Diário do Nordeste