No fim da tarde desta sexta-feira (30), dois dos três candidatos à Presidência melhor posicionados nas pesquisas desembarcam no Ceará para tentar conquistar votos para si e para seus aliados que disputam o Governo do Estado. O ex-presidente Lula (PT) estará em Fortaleza para uma caminhada pelo Centro da Cidade. Já o ex-ministro Ciro Gomes (PDT) retorna a Sobral, seu berço político, para uma carreata.
Considerado por anos como um “universo político à parte”, que unia adversários nacionais em torno de um mesmo projeto, o Ceará enfrenta, neste ano, uma disputa local que reflete o cenário nacional atual. Em pouco mais de 40 dias de campanha, a eleição para o Executivo estadual espelhou a disputa pela Presidência, com polêmicas e alianças desfeitas, além de refletir os desempenhos dos postulantes nas pesquisas.
Agora, começa a contagem regressiva para o pleito com atos simultâneos de dois adversários que têm como objetivo o Palácio do Planalto, mas acompanham de perto o desempenho de seus aliados no Ceará.
“Quando pensamos na dinâmica dos grupos políticos e em como funciona a política no Ceará, a vitória ou a derrota de um candidato apadrinhado sinaliza muito mais sobre a força ou a fraqueza do padrinho político que propriamente do candidato”, explica a professora de Teoria Política da Universidade Estadual do Ceará (Uece), Monalisa Torres.
PR QUE LULA VEM AO CEARÁ?
O petista estará em caminhada partindo da Praça da Bandeira (Praça Clóvis Beviláqua) e encerrando na Praça do Ferreira. Ao lado dele, estão os candidatos Elmano de Freitas (PT), ao Governo, e Camilo Santana (PT), ao Senado.
Para Monalisa Torres, há diversos motivos que trazem o ex-presidente ao Ceará em um momento decisivo, um deles é a possibilidade de liquidar a disputa pela Presidência e tentar estimular um desfecho do pleito estadual já no primeiro turno.
“Embora nacionalmente as campanhas estejam encaminhadas, com Lula à frente com um percentual significativo de votos, a vinda dele sela esse momento para, talvez, tentar vencer em primeiro turno, com a possibilidade do Elmano crescer ainda mais e atingir também esse feito. Seria para Lula e Camilo sinalizações importantes”, acrescenta Torres.
Conforme a pesquisa Ipec divulgada no último dia 26 de setembro, o petista soma 48% das intenções de votos, seguido do atual presidente, Jair Bolsonaro (PL), com 31%. Em terceiro lugar, Ciro Gomes tem 6%. Para o levantamento, o Instituto ouviu 3.008 pessoas nos dias 25 e 26 de setembro. Neste cenário, Lula poderia vencer no primeiro turno considerando o limite da margem de erro, de dois pontos percentuais para mais ou para menos.
No Ceará, a pesquisa Ipec encomendada pela TV Verdes Mares, divulgada em 22 de setembro, mostrou Lula com 63% das intenções de votos e Bolsonaro com 18% na pesquisa estimulada. Ciro somou 10%. O levantamento ouviu 1.200 pessoas entre os dias 19 e 21 de setembro, todos eleitores votantes no Estado do Ceará.
Monalisa aponta ainda que a vinda da principal liderança nacional do PT dá a Camilo Santana um papel de liderança local com poder de influência nacional. Quem reforça essa análise é o cientista político Josênio Parente, professor da Universidade Estadual do Ceará (Uece).
“Camilo parecia ser um petista que não tinha peso dentro do partido até pouco tempo atrás. Só agora ele foi chamado a assumir um papel que, ao que tudo indica, vai trazer como consequência um peso muito significativo para ele na política cearense. Na realidade, essa disputa entre Ciro e Lula no Ceará terá como consequência uma demonstração real de quem tem força em cada lado”, avalia.
O CEARÁ QUE LULA E CIRO ENCONTRARÃO PELA FRENTE
De fato, Lula encontrará no Ceará um PT raramente tão unido. Desde a decisão de lançar Elmano de Freitas como candidato da sigla, alas distantes entre si do partido passaram a reforçar o nome do deputado estadual como candidato ao Governo.
Seu aliado no Ceará também vive um momento favorável nas pesquisas. O mesmo levantamento do Ipec realizado no Ceará na semana passada mostrou uma ascensão do petista, que aparecia com 30% nas pesquisas, empatado na liderança com Capitão Wagner (União), que somava 29%. Em menos de um mês, o aliado de Lula cresceu 11 pontos percentuais, segundo o Ipec.
Ao mesmo tempo, na disputa pelo Governo do Ceará, Roberto Cláudio (PDT) vem enfrentando dificuldade para embalar bons resultados. Entre a primeira pesquisa Ipec, divulgada em 1º de setembro, e a mais recente, divulgada na semana passada, o pedetista caiu seis pontos percentuais, chegando à terceira colocação.
POR QUE CIRO VEM AO CEARÁ?
Diante desse cenário, Ciro desembarca no Estado para uma carreata em Sobral. Ao seu lado terá Roberto Cláudio. Para Josênio Parente, um mau desempenho de Ciro nacionalmente e de seu aliado no Estado pode inviabilizar planos do pedetista. Além disso, ao longo da campanha, Ciro escalou os ataques a Lula, chegando à reta final com o petista como seu principal alvo.
“Ciro fez uma estratégia alta, no sentido de poder ganhar muito ou perder muito, ao fazer esse enfrentamento com Lula. Foi uma aposta alta demais que agora ele não pode voltar atrás, agora chegou o momento do desfecho”, avalia.
“Nesse sentido, o problema que surge para ele é que uma derrota no Ceará, seja do candidato dele, seja ele próprio ficando atrás de Lula e Bolsonaro no próprio estado, é um sintoma muito pesado de enfraquecimento. Ele fez do Ceará uma arena importante, agora tem esse desafio de ter um bom desempenho aqui”, acrescenta.
Monalisa Torres aponta para uma situação até mais dramática para o pedetista. “Uma derrota para ele aqui sinaliza um encerramento de ciclo. A ausência de Roberto Cláudio, por exemplo, no segundo turno é muito mais uma derrota do Ciro, da liderança dele, da forma como ele atropelou o processo, já que ele conduziu a escolha do candidato ao Governo”, afirma.
O PDT QUE CIRO ENCONTRARÁ NO CEARÁ
Para além da pressão elevada com as pesquisas mais recentes, os pedetistas enfrentam uma inédita crise interna no Estado, com o próprio Ciro vendo o apoio de correligionários minguar. Em entrevista ao Flow Podcast na última segunda-feira (26), o ex-governador disse que se vê ‘traído’ no Estado.
“Dei minha vida ao povo cearense, e algumas lideranças, todas que eu ajudei a formar, se reuniram e meteram a faca nas minhas costas, me traíram, estou lá sem ninguém me defendendo. Sem ninguém não é verdade, o Roberto Cláudio, que é o melhor cara, que é meu candidato a governador lá, isso dói demais num cara”, disse Ciro.
Para piorar ainda mais a crise, o prefeito de Sobral, Ivo Gomes, irmão de Ciro, fez publicação nas redes sociais atacando a chapa PDT-PSD ao Governo do Estado por supostamente omitir da campanha o pedetista.
Ivo listou imagens das redes sociais de Roberto Cláudio, do candidato a vice, Domingos Filho (PSD), e da candidata ao Senado, Érika Amorim (PSD), além da página do presidente do PDT Ceará, André Figueiredo, e desafiou: “encontre nos Instagrans a seguir uma única referência ou pedido de votos ao Ciro”.
Na publicação de Ivo, Figueiredo respondeu. “Consciência tá doendo, Prefeito? Como você não está na campanha do PDT não pode ver como trabalhamos o nome do nosso Presidente Ciro”, respondeu o presidente do PDT-CE.
Para Monalisa Torres, esse é mais um elemento que traz Ciro ao Ceará.
“Isso mostra que o partido não está unido, não está unificado e ajuda a lançar luz sobre a própria dificuldade que o Roberto Cláudio está tendo na campanha”, argumenta.
“Então, é uma tentativa de reforçar a candidatura dele aqui e de fazer com que, caso haja uma derrota, não seja tão feia (…) Seja como for, o resultado dessa eleição vai dizer muito sobre o futuro dos Ferreira Gomes”, conclui Torres.
Fonte: Diário do Nordeste