Uma pesquisa da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) desenvolveu uma inteligência artificial capaz de identificar se um alimento é orgânico ou não. A primeira etapa do estudo analisou se tomates possuem resíduos de agrotóxicos.
Os resultados são inéditos e foram publicados na quinta-feira (11), na Food Chemistry, uma das revistas científicas mais importantes na área de alimentos. Segundo o pesquisador Rodrigo Catharino, o objeto é facilitar a vida dos consumidores, que irão poder checar o que estão comprando.
“O consumidor vai ter a certeza de que está consumindo um produto orgânico, o que é muito importante, devido ao custo, e também vai ter uma segurança alimentar, porque vamos estar dizendo o que tem dentro dele. Gera segurança e qualidade com a tecnologia desenvolvida”.
O próximo passo, então, é criar um equipamento portátil para ser usado em mercados. Esse equipamento, ainda segundo o Catharino, pode ser desenvolvido em chips, já que são tecnologias que estão se tornando tendência por serem mais baratas.
OUTROS ALIMENTOS
De acordo com os pesquisadores, o tomate serviu como base da pesquisa, mas o estudo pode ir muito além. A pesquisa, agora, depende de parcerias com empresas para que o equipamento seja produzido em escala industrial e possa chegar ao consumidor.
“O que foi desenvolvido aqui foi uma grande plataforma, que pode ser colocado em qualquer fruta, qualquer legume, qualquer verdura, do mercado de orgânico e não-orgânico, justamente para gente ter a segurança no que está sendo consumido e produzido”, finalizou Catharino.
COMO FUNCIONA A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL
Cinco minutos é o tempo que os cientistas levam para descobrir, por meio da inteligência artificial, se o tomate está contaminado por resíduos químicos. Além disso, a tecnologia também identifica se o fruto tem preservado os compostos que fazem bem à saúde.
Para essa análise acontecer, primeiro os pesquisadores fazem um corte da região do pedúnculo, a parte que faz a ligação entre o fruto e a planta. Depois, uma placa do silício é colocada nessa parte e absorve o material que será utilizado.
Com uma mistura de solvente, a substância é analisada com um equipamento chamado espectrômetro de massa. A partir disso, a inteligência artificial identifica os compostos e gera os resultados em forma de marcadores no computador.
Segundo os pesquisadores, a tecnologia consegue capturar qualquer sinal de agrotóxico e também dos compostos benéficos, que devem estar em grandes quantidades.
“Por exemplo, vitamina C, B, você consegue ver bastante. Você consegue ver alguns compostos fenólicos, que são antioxidantes, como o ácido cafêico, você também consegue ver o betacaroteno, que confere a cor ao tomate. Você consegue ver diversos micronutrientes que auxiliam no valor nutricional desse alimento”, explicou o cientista Arthur de Oliveira.
ACESSÍVEL À POPULAÇÃO
O artesão Charles Marinho de Sousa compra a cada 15 dias produtos orgânicos, como verduras e legumes. Ele é cliente de um projeto que só comercializa agroecológicos e orgânicos, ou seja, produzidos sem adubo químico ou agrotóxicos. Para ele, a descoberta será de grande ajuda.
“A qualidade de vida vem em primeiro lugar. E o produto orgânico é um produto que realmente oferece para gente essa qualidade […] Um equipamento que ajude a gente a ter essa certa que o produto é realmente orgânico, isso é muito bom e vai ajudar bastante”, disse Charles.
No lugar onde o artesão faz as compras, a fiscalização dos produtos ocorre de forma manual. Os integrantes do projeto vão até os produtores e checam se eles estão seguindo as normas, que incluem que os alimentos sejam cultivados sem agrotóxicos ou adubo químico.
Membro do projeto, Renato Alves Libânio avalia que a nova tecnologia trará facilidade a produtores e consumidores.
“Vai facilitar para todo mundo, tanto para nós que temos esse espaço que recebe, quanto para a pessoa que compra e para o produtor também. Porque o produtor, às vezes, tem um vizinho que não é orgânico, e aí ele faz uma pulverização e com o vento, acaba empurrando o ‘veneno’ para o produtor que é orgânico. Então essa ferramenta vai ser importantíssimo para toda essa cadeia.”
Em um âmbito estadual e nacional, a fiscalização é da Secretaria Estadual da Agricultura e do Ministério da Agricultura que, em conjunto com empresas que fazem a certificação, emitem selos de identificação para alimentos orgânicos.
MÉTODO SIMILAR A ESTUDOS DA COVID
Outro fator que chama a atenção na pesquisa é que, apesar de estarem em áreas diferentes, a metodologia do estudo do tomate é igual ao de alguns estudos com a Covid-19.
Isso porque, nos estudos com o vírus, são analisados a resposta do organismo humano à Covid, enquanto no estudo com o fruto, os pesquisadores também analisam a resposta do tomate ao estímulo dos agroquímicos.
“Aminoácidos, que são pequenas proteínas, nos orgânicos têm uma concentração maior desses micronutrientes em relação aos não-orgânicos, justamente porque pode haver uma espécie de resposta do tomate não-orgânico ao próprio agroquímico que ele está sendo exposto”, disse Arthur de Oliveira.